segunda-feira, 31 de maio de 2010

INFÂNCIA PERDIDA

Abriu o saquinho e pegou a pequena pedra. Olhou bem para ela, mas sem muita demora. A latinha já estava pronta. Ajeitou na posição, colocou a boca e riscou o isqueiro. A fumaça que era inalada o fazia ficar ofegante e ao mesmo tempo ligeiro. Nela iam todos os seus problemas, suas angustias, seus medos... Tudo que acontecia a sua volta se fora em poucos minutos. Aproveitou a alteração de seu estado mental até o último instante. Mas a realidade logo vinha bater a sua porta. O mundo se reintegrando a sua volta. Precisava arranjar outro daquele belo anestésico.
Revirou os bolsos e constatou que acabaram as últimas moedas. Tinha de dar um jeito. Levantou cambaleante, segurando nas paredes. Olhou fixamente para a porta daquele quarto fedorento em que vivia e tentou uma linha reta. Ao se aproximar da porta sentiu o efeito passar, a compulsão o instigava a ir em busca de mais, Danilo tinha apenas 13 anos, porém, já havia vivido situações de difícil compreensão. Desceu as escadas as carreiras. Lembrou que o pai já não aparecia a mais de uma semana e pensou na última vez que viu sua mãe indo embora e o abandonando com aquele verme.
Ao chegar à rua olhou em volta. Havia um banco perto dali. Era época de pagamento. Virada do mês. A operação seria fácil. Era só esperar algum senhorzinho sair do banco com seus bolsos recheados de dinheiro e colocar suas mãozinhas de tesoura para funcionar.
O movimento de pessoas no banco era grande. Nos caixas eletrônicos haviam filas enormes. A grana de que ele precisava deveria vir sem muitas dificuldades. Pensamentos confusos bombardeavam sua mente. Cuidar de carro já fora época, o negocio era meter um 157. Derrepente viu um coroa saindo do banco com passos apressados. Sentiu o cheiro da adrenalina no ar. Era por ele que esperava. Não podia estar enganado.
Os pensamentos começaram a clarear. Perseguiu sua vítima, à distância, por alguns quarteirões. A hora era aquela. Não podia vacilar. Aproximou-se rapidamente, mas sem dar na pinta. Passou pelo coroa e pá... Um esbarrão e as mãozinhas escorregaram para dentro do bolso. Não podia ser. Bolso errado. O coroa segurou a mão que já partia em retirada.
- Ladrão... É ladrão...
Danilo jogou a vítima no chão e saiu em disparada. As vozes se multiplicaram.
- Pega ladrão! Pega ladrão!
Com uma rápida olhada para trás, viu algumas pessoas levantando o senhorzinho, que sumiu logo do seu campo de visão, por causa da rapaziada que estava correndo atrás dele. Olhou para frente e continuou correndo. Tirou o boné e escondeu dentro da bermuda. Deu mais uma olhada para trás. A multidão continuava na perseguição. Parecia ter mais gente.
- Pega ladrão! Pega ladrão
Mais a frente havia um cruzamento, de perto avistou o sinal que se abria e a multidão que o perseguia, vinha logo atrás. Era tudo ou nada. Passava ou seria pego. Teria que ser rápido. Em segundos sentiu o vento do ônibus passar como um tornado ao seu lado e sem parar de correr, percebendo que estava a salvo, continuou sua sina.
Pensou na igreja, na escola, na família, mas sabia que tudo era muito distante. Vivia no mundo sem regras. Conheceu a fome, as drogas e a prostituição muito cedo. Lembrou das vezes em que era espancado pelo padrasto, das humilhações que sofria da mãe... A vida passara como um filme sobre sua cabeça. Der repente algo, ou alguém, o segurou pelo braço. Sentiu o corpo subindo no ar e se chocando contra a calçada, foi logo rodeado pela multidão. Gritos indecifráveis chegavam ao seu ouvido, enquanto era golpeado por todos os lados. O Sol foi sumindo aos poucos... A boca ficando seca...
Algumas horas depois, nas rádios da cidade, o assunto fora divulgado com teor sensacionalista. Repórteres policiais, jornalistas e políticos se posicionaram a favor da redução da maior idade penal. No hospital o médico olhava para o garoto em coma. A prancheta fixava um papel que dizia : Traumatismo Craniano.
- Foi pego roubando. – comentou a chefe da enfermaria com o médico de plantão.
As pancadas que levou o deixaram em coma. Ao final da noite o médico atestou a morte cerebral. Um enterro com poucos parentes e nenhum amigo se seguiu. Aliás, como muitos não sabiam, Danilo tinha o sonho de ser jogador de futebol, mas a vida o reservou caminhos diferentes. Quem sabe se tivesse tido oportunidade?
Os dias passaram e com eles estão indo nossas esperanças. A falta de amor, de carinho e de solidariedade arraigam em nossa sociedade a indiferença que nos faz pensar: “Não temos nada com isso e a culpa é do outro”. Fazendo-nos acreditar que temos o direito de julgar e condenar de forma arbitrária e cruel.
Os mesmos que julgaram e puniram esse garoto, se anulam ao verem políticos roubando dinheiro publico da educação, saúde, assistência social, segurança... São milhões desviados e, a cada eleição, estão eles aí de novo. Ao invés de nos indignarmos, aplaudimos e depositamos neles nosso voto para que continuem roubando. Temos de dar um basta. Isso sim é revoltante. Temos de canalizar nossa ira para os grandes responsáveis por essa situação, onde pobres se matam, enquanto uma classe média apática e alienada assiste a todo esse espetáculo sórdido na grande mídia, sem expressar mais que algumas queixas sem efeito.


Por: Fabio da Silva Barbosa
Evandro Santos Pinheiro

5 comentários:

  1. mt bom o conto ,
    muitas pessoas tem essa realidade em suas vidas.

    sem ter ninguen para apoiar i tenta ajudar a sai dessa vida de drogas é isso que dá.

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  2. neem li mais tah valendo !

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  3. Nossa Muito Boa a mensagem gostei

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